Quantas vezes não dei por mim a pensar e a imaginar como seria fazer um programa AFS, como seria ser um AFSer e na quantidade de pessoas que teria a oportunidade de conhecer e com quem iria conviver se o fizesse. Eram muitas as vezes em que o meu pensamento se enchia com todas estas ideias e imagens que, não sei como, se iam formando, e também eram muitas as vezes em que, no meu interior, cada vez mais era maior a vontade de o fazer, de o experienciar. Quantos não foram os estudantes AFS que conheci, que admirava e a quem atribuía todo o meu louvor por achá-los as pessoas mais corajosas que alguma vez podia ter encontrado, por terem deixado tudo o que lhes era querido e terem partido à descoberta ao fazerem o seu intercâmbio. Eu também sentia que precisava tanto disto como do ar que necessito para sobreviver. Era urgente!

Foi no dia 20 de agosto (data que jamais me escapará da memória) que deixei tudo para trás em busca deste meu sonho. E por ser meu o queria tanto, mas tanto, que foi esse querer que me deu a coragem e motivação para deixar a minha família e amigos, os meus estudos e paixões, a minha cultura, as minhas origens, enfim… o meu querido PORTUGAL!

Não foi fácil. Foi um dia intenso e bastante stressante que também não irei esquecer: muita confusão, filas enormes, os 10kg de excesso de bagagem que tinha e que, num estalar de dedos, fui obrigado a tirar para fora da mala (roupa, calçado, memórias, prendas…), sem falar das balanças do aeroporto que não estavam a funcionar (nunca estavam certos quanto ao peso da mala; se era preciso tirar mais coisas ou não…) e, claro, a despedida: (até agora) os 15 minutos mais custosos de toda a minha vida – o momento em que os meus olhos se encheram de lágrimas e o meu coração parecia querer saltar-me do peito para fora; o momento em que abracei a minha família pela última vez e, pela última vez, senti o seu cheiro e toque.

“Está na hora! Tens de passar.” – disse a voluntária que estava presente e que, até mesmo quando as coisas pareciam mais difíceis, ela, com toda a sua calma e profissionalismo, me tranquilizava e repetia vezes sem conta todos os detalhes que eu precisava de saber. Um obrigado a esta pessoa maravilhosa! E lá fui eu, “atolhado” de camisolas, casacos e cachecóis, desorientado e com a imagem da minha família sempre presente na minha mente. Mas, houve um momento em que, no meio de todo aquele aparato, refleti: “Está na altura de viveres aquilo com que sempre sonhaste nestes últimos 2 anos. Vai e aproveita ao máximo esta experiência! Estás a ter a sorte de muitos que gostariam de estar no teu lugar…”.

Primeiro para Frankfurt, onde, ao chegar, me encontrei com os 50 alemães que também vinham para a Argentina e, depois, todos juntos para Buenos Aires. Mais horas de voo me esperavam (desta vez, 11 horas) e, cada vez mais, a ânsia de chegar era maior. Enquanto não partia, ainda no aeroporto de Frankfurt, ia desfrutando os minutos que me restavam antes de entrar no avião para conhecer e falar com os meus novos companheiros de jornada. A viagem foi longa e mal consegui dormir porque estive sempre muito indisposto, com frio e dor de cabeça e, para piorar, de vez em quando vinha-me à memória a minha família e o quão difícil estava a ser deixá-los.

No dia 21 de agosto, lá estava eu em Buenos Aires. Já não podia ver mais aviões nem controlo de passaportes e bagagens à minha frente! Já só queria descansar e pôr as ideias em ordem. Para além dos alemães, os primeiros estudantes que conheci foram dois russos (um rapaz e uma rapariga), uma húngara e um estudante checo – estes dois últimos tinham vindo sozinhos dos seus países, tal como eu. Depois, num piscar de olhos, a sala do aeroporto onde nos encontrávamos começou a encher-se de t-shirts de todas as cores: os belgas e os americanos reclamavam o azul, os suíços contrastavam com o vermelho, o laranja era vestido pelos austríacos, o amarelo provinha de Itália e, assim, começou a formar-se toda uma fusão de cores de todo o mundo. Mais tarde seguiu-se a Noruega, a Islândia, a Suécia, a Turquia e muitos mais países com quem troquei impressões e fiz amizades.

Por fim – e depois de estarmos divididos por grupos (ainda no aeroporto de Buenos Aires) –, seguimos de autocarro para um outro aeroporto, a fim de apanhar o último avião rumo à província de Neuquén (sul da Argentina), onde iria ser recebido pela minha família de acolhimento de boas-vindas. (Nos primeiros 11 dias, estive em casa de uma família de boas-vindas porque a minha família de acolhimento ainda se encontrava de férias na data em que eu chegava.)

Foi nesse exato momento – quando cheguei ao aeroporto de Neuquén – que comecei a sentir algumas diferenças culturais e onde apareceram as primeiras “adversidades”, a começar pela forma de cumprimentar: sempre com um só beijo na face direita da pessoa, seja homem ou mulher, grande ou pequeno, conhecidos e desconhecidos – mas sempre com um só beijo! Logicamente, há casos em que os homens estendem a mão entre si, embora seja rara a vez que isso acontece. As distâncias, aqui (dentro das localidades/cidades), calculam-se por quadras – e não por metros – ou pelo tempo. Os horários tardios para as refeições (o almoço a partir das 14h30-15h e o jantar a partir das 23h-23h30), a “siesta” que é sagrada a seguir ao almoço, o “dulce de leche” que nunca pode faltar nas casas argentinas, a importância de ter uma vida social bastante ativa e frequentar imensas festas, a comida muito à base de carne (“el asado Argentino”) e massas, os transportes, a importância que o futebol tem na vida dos argentinos (generalizando), os hábitos na escola, a roupa e muitos outros detalhes são algumas das  diferenças com que me deparo todos os dias. E claro não podia deixar de mencionar o facto de, quando as pessoas sabem que sou de Portugal, ser questionado sempre com a mesma pergunta: “Quién es lo mejor: Messi o Ronaldo?”.

Há mais de um mês que aqui estou e, cada vez mais, sinto-me encantado com os diferentes hábitos e costumes, as paisagens, com a generosidade e amabilidade das pessoas e com tudo o que aqui se passa. Todos os dias agradeço por ter sido louco o suficiente para embarcar nesta aventura. Que os restantes 10 meses sejam tão (ou mais) felizes como este que passou!

Tchau, nos vemos y que anden bien!

João Antunes | Estudante AFS 2015/2016 | Portugal-Argentina